Apelação nº 7000401-18.2022.7.00.0000.
Palavras-chave:
Apelação, Defesa, Recusa de obediência, Constrangimento ilegal, Ameaça, Emprego de arma, Excludente de ilicitude, Exercício regular do direito, Dever legal, Decisão unânime.Resumo
As provas não deixam dúvidas de que o acusado, no exercício do serviço de sentinela, em horário de boa visibilidade, constrangeu ilegalmente graduado, o qual, investido da função de Sargento Polícia, incumbia realizar a ronda e a fiscalizar o serviço.
Não obstante incontestável a identidade do graduado, o apelante tratou-o como se fosse uma pessoa estranha ao aquartelamento ou
uma ameaça à segurança da organização militar, quando, após dar-lhe o comando “alto”, determinou-lhe que se retirasse do seu
posto de vigilância, com a arma carregada em sua direção, conduta que se amolda perfeitamente ao crime de constrangimento ilegal,
previsto no art. 222, § 1º, do Código Penal Militar.
Restou demonstrado que, ato contínuo ao constrangimento ilegal perpetrado em face do graduado, o acusado se recusou a cumprir ordem do Oficial de Serviço para que lhe entregasse o armamento e deixasse o seu posto de vigilância, caracterizando, assim, o crime de recusa de obediência, previsto no art. 163 do Código Penal Militar.
Não se sustenta a tese defensiva de que o acusado, ao assim agir, cumprira fielmente os regulamentos internos da Marinha, em especial as normas afetas aos deveres e às prerrogativas da sentinela, entre as quais destaca a sua inviolabilidade, a proibição de abandonar o seu armamento, assim como o seu posto, sem ser rendido, logo estaria acobertado pelas excludentes de ilicitude do
estrito cumprimento do dever legal e do exercício regular de direito, previstas nos incisos III e IV do art. 42 do Código Penal Militar.
As normas internas visam ao correto funcionamento e à organização da unidade militar, bem como a sua segurança, de modo que todo o aparato militar deve ser utilizado de acordo com as ordens recebidas, as quais, evidentemente, não se restringem às ordens escritas. Por óbvio, a norma interna, ao assim dispor, quis impedir que a sentinela, em situações ordinárias, deixasse de cumprir com suas funções, abandonando o seu posto ou o seu armamento, sem a devida autorização, o que não é o caso dos autos. A prevalecer tal entendimento, estar-se-ia ignorando a hierarquia e a disciplina militares, que, como se sabe, regem o próprio funcionamento das organizações militares.
Improcedente, ainda, o pedido da Defesa, com base no princípio da legalidade e da retroatividade da lei mais benigna, ínsitos nos arts. 1º e 2º, § 1º, do Código Penal Militar, a fim de ser aplicada a ordem interna da Marinha que alterou os procedimentos a serem adotados pelas sentinelas. Tais dispositivos se referem à entrada em vigor de lei “stricto sensu” mais favorável ao apenado, não podendo ser confundida com meras alterações de normativos administrativos afetos à execução de serviços internos na organização militar, as quais, por óbvio, não têm o condão de eximir o acusado de sua responsabilidade penal.
Não há como prosperar a pretensão de afastamento da “qualificadora”, pelo simples fato de que a lei impõe a incidência das causas de aumento na terceira fase da dosimetria da pena. E, no caso, restou demonstrado ter o acusado praticado o constrangimento com o emprego de arma, causa de aumento da pena prevista no § 1º do art. 222 do Código Penal Militar.
Apelo defensivo desprovido. Decisão unânime. DECISÃO unânime.